Economia
Setor produtivo de MS está otimista com aprovação da reforma tributária
Correio do Estado
19 de Dezembro de 2023 - 09:18
Após 30 anos de discussão, a reforma tributária foi aprovada na Câmara dos Deputados em última instância, na sexta-feira. A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 45/2019 deve ser promulgada amanhã pelo Congresso Nacional.
Empenhado em concluir a pauta tributária, o governo terá 180 dias após a difusão da PEC para enviar ao Legislativo projetos de leis complementares e, assim, regulamentar a emenda.
O setor produtivo de Mato Grosso do Sul está otimista com a aprovação do texto. O presidente da Federação das Indústrias do Estado de Mato Grosso do Sul (Sistema Fiems), Sérgio Longen, comemorou a aprovação da reforma, que simplifica impostos sobre o consumo e que prevê fundos para o desenvolvimento regional e para bancar créditos do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) até 2032, além de unificar a legislação dos novos tributos.
“Entendo que é um avanço significativo. Teremos 10 anos de adaptação a esse projeto aprovado. Algumas leis complementares virão a partir do próximo ano, mas precisamos fazer com a sociedade um grande debate sobre os avanços da reforma tributária”, disse Longen.
Representando o comércio, a presidente da Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas de Mato Grosso do Sul (FCDL-MS), Inês Santiago, exaltou a decisão. “Conseguimos manter muitas atividades econômicas do setor de serviços na alíquota reduzida, mantida também a possibilidade de reduzir em 30% os tributos cobrados na prestação de serviços de profissionais liberais”, pontuou.
Outras entidades representativas do comércio, de serviços e do agronegócio sul-mato-grossense foram consultadas pela reportagem, mas não retornaram até o fechamento desta edição.
Os destaques da reforma são a unificação dos impostos federais, estaduais e municipais e ainda a criação de um sistema baseado no Imposto sobre Valor Agregado (IVA). Também foi votado o regime diferenciado para os profissionais liberais, como advogados, médicos, engenheiros e contadores. Essas categorias terão redução de 30% na alíquota geral.
A PEC vai mudar toda a sistemática da cobrança de impostos no Brasil. O objetivo é simplificar a tributação para as empresas e para todos os brasileiros, facilitando o crescimento econômico do País. Essa é a primeira parte da reforma tributária, que trata dos impostos cobrados sobre o consumo. A tributação da renda será objeto de uma segunda etapa.
EFEITOS
A reforma tributária tem o potencial de gerar um crescimento adicional da economia superior a 12% em 15 anos. Atualmente, isso representaria R$ 1,2 trilhão a mais no Produto Interno Bruto (PIB) do ano passado. Todos os setores da economia seriam beneficiados pela reforma. Há a previsão ainda de redução das desigualdades sociais por meio de uma tributação mais justa.
Ao Correio do Estado, o mestre em economia Lucas Mikael explicou que a reforma tributária prevê a substituição de cinco tributos: Programa de Integração Social (PIS), Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), esses três de competência federal; ICMS e Imposto sobre Serviços (ISS), de competências estadual e municipal, respectivamente, por um IVA.
O especialista destacou que a proposta prevê uma mudança fundamental na cobrança de impostos, transitando do modelo de cobrança na origem para o destino final, onde o bem ou serviço será consumido.
“Essa transição, que ocorrerá ao longo de um período de implementação, visa combater a chamada guerra fiscal, um fenômeno em que os estados competem entre si por meio de benefícios fiscais na tentativa de atrair investimentos e empresas”, salientou.
Mikael ainda afirmou que o texto aprovado é, em geral, melhor que o do Senado por reduzir as exceções. “O mais importante de tudo é finalmente estarmos aprovando a reforma tributária. É um feito histórico, de enorme importância política, e que deve propiciar a transição para um modelo tributário mais moderno, eficiente e também justo”, analisou.
CESTA BÁSICA
Um dos temas mais polêmicos – a alimentação básica – foi alvo de críticas durante a discussão da reforma, contando inclusive com questionamento da Associação Brasileira de Supermercados (Abras), que estimou um aumento de cerca de 60% dos tributos incidentes sobre a cesta básica.
A cesta básica estendida previa alíquota reduzida de 40% de Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) em produtos alimentícios. Os mais pobres ainda poderiam resgatar o imposto embutido no preço de alimentos por meio do mecanismo de devolução chamado cashback (dinheiro de volta).
Entretanto, a cesta básica estendida foi retirada do texto. Dessa forma, o relator da PEC na Casa, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), incluiu a criação de uma nova cesta básica nacional de alimentos, a qual será totalmente isenta de impostos.
“A definição dos produtos que comporão essa cesta será estabelecida por meio de uma lei complementar, a qual considerará a diversidade regional e cultural da alimentação no País”, apontou Mikael.
Atualmente, vários itens que integram a cesta básica são tributados no chamado efeito cascata, com os tributos incidindo sobre o preço na etapa anterior da cadeia, antes de chegarem as prateleiras.
Já a isenção atual de impostos federais sobre os produtos da cesta, por um lado, diminui alguns itens, porém, por outro, impede o aproveitamento de créditos tributários, devoluções de tributos pagos nas etapas anteriores da cadeia produtiva.
No sistema de IVA dual, a devolução dos créditos tributários, segundo o governo, compensaria a cobrança de impostos. A alíquota do IVA dual só será definida após a reforma tributária.
O novo fator de redução de 60% e a futura alíquota zero deverão baratear os produtos da cesta básica, contudo, o cálculo sobre o impacto final só poderá ser feito quando a reforma tributária já estiver em vigor.
Os itens industrializados, que contam com cadeia produtiva mais extensa, deverão ter redução maior de preços. Alimentos in natura ou pouco processados deverão ter redução mais discreta ou até leve aumento, em função do pouco crédito tributário.
REMÉDIOS
O texto atual prevê a alíquota reduzida em 60% para medicamentos e produtos de cuidados básicos à saúde menstrual. Na lista, foi incluído a redução da alíquota de itens de nutrição enteral e parenteral, que previnem ou tratam complicações da desnutrição.
De acordo com Mikael, a reforma não deverá trazer grandes impactos sobre o preço dos medicamentos. Os genéricos, por exemplo, estão submetidos a uma legislação específica. Além disso, a Lei nº 10.047/2000 estabelece um regime tributário especial a medicamentos listados pelo Ministério da Saúde.
Entre as modificações, o Senado incluiu na isenção de IVA a compra de medicamentos e dispositivos médicos pela administração pública e por entidades de assistência social sem fins lucrativos.
COMBUSTÍVEIS
Para combustíveis e lubrificantes, a reforma tributária estabeleceu um regime de tratamento diferenciado. O IVA dual, com alíquota única em todo o território nacional e variando conforme o tipo de produto, será cobrado apenas uma única vez na cadeia produtiva, seja no refino, seja na importação. A mudança segue uma reforma proposta em 1992.
Na tramitação no Senado, foi incluída a possibilidade de cobrança do Imposto Seletivo (IS), tributo sobre produtos que de alguma forma gerem danos à saúde e ao meio ambiente, sobre combustíveis e petróleo (para a extração de petróleo e 1minérios haveria alíquota de 1%). Conforme o Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), o IS deve gerar R$ 9 bilhões em arrecadação, considerando apenas a exploração de petróleo e sem os demais minérios.
O Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP) observou que o modelo diferenciado levará a provável alta do preço final aos consumidores. No entanto, entre os especialistas de mercado, a estimativa é de que o impacto ainda seja incerto, uma vez que muitos pontos do regime serão definidos por leis complementares, em que a reforma prevê a possibilidade de concessão de créditos tributários. Além disso, o impacto só será conhecido de fato após a definição da alíquota cheia do IVA dual.
SAIBA
O texto da reforma tributária prevê a criação de um Fundo de Desenvolvimento Regional a ser custeado pela União. Ele começará com um valor de R$ 8 bilhões ao ano em 2029, quando terá início a extinção gradual dos impostos estaduais e municipais e a substituição pelo novo IBS.
Essa quantia crescerá gradativamente até chegar a R$ 60 bilhões em 2043. A reforma cria ainda um conselho federativo que será responsável por centralizar a arrecadação do futuro IBS, o imposto que vai reunir e substituir o ICMS e o ISS.