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Esporte

Trabalhadores que produzem a bola da Copa ganham R$ 220 por mês

O futebol não é o esporte mais popular no Paquistão, que herdou do colonizador britânico a paixão pelo críquete

Globo Esporte

22 de Maio de 2014 - 13:00

Nos corredores da Adidas, funcionários brincam que o único país garantido na final da Copa do Mundo é o Paquistão.  É ali no subcontinente indiano, na cidade de Sialkot, que está 70% da produção da Brazuca, a bola oficial do Mundial fabricada pela multinacional alemã.

O futebol não é o esporte mais popular no Paquistão, que herdou do colonizador britânico a paixão pelo críquete. Mas, por razões que o senso comum desconhece, o país se tornou o centro da produção mundial de bolas de futebol.

Em Sialkot, cerca de 2.000 fábricas produzem anualmente 20 milhões de bolas para as gigantes do setor, como Nike, Adidas e Reebok. A empresa Forward Sports, a maior da região, ganhou o contrato da Adidas para o Mundial do Brasil, superando fábricas da China que foram responsável por toda a produção da Jabulani, a bola da Copa de 2010.

"Agora que o padrão de vida na China está crescendo, os salários também estão", disse Mohammad Younus Sony, chefe da associação da indústria de esportes do Paquistão, ao site da Bloomberg.  "Nós temos um competidor a menos. Temos mais trabalho barato e nossos produtos são bons em preço."

A maioria dos 1.800 trabalhadores que costuram a bola da Copa recebem o salário mínimo no Paquistão, que foi recentemente reajustado para 10.000 rúpias mensais, o equivalente a cerca de R$ 220. O custo médio do aluguel de um apartamento de um quarto no centro da cidade é estimado em 17.500 rúpias (R$ 390).

No Brasil, a Brazuca é encontrada nas lojas por até R$ 400.

A Câmara de Comércio de Sialkot admite que os salários pagos são baixos e que vem tentando mudar a situação. Mas os empregadores dizem depender de um aumento no preço do produto no mercado externo para turbinar os salários.

"Eu amo futebol porque eu sei que minha família não teria condições de comer se eu não costurasse bolas de futebol", disse Ghafoor Husain, 59 anos, ao site indonésio KBR.com. Husain é um dos 200 mil trabalhadores empregados por essa indústria, que é a base da economia de Sialkot (na entrada da cidade, uma bola de futebol dourada marca a importância do produto para os locais).

A tradição paquistanesa nesse mercado é antiga, mas foi abalada na década de 1990 quando organismos internacionais começaram a denunciar a exploração do trabalho infantil nas linhas de montagem.

Além da presença de crianças nas fábricas, a prática era estimulada por uma relação trabalhista que permitia ao trabalhador costurar as bolas em casa.  O hábito criou a figura do atravessador, que levava material para casa, subempregava crianças na costura das bolas, e as entregava de volta para a empresa.

Estimativas da época davam conta de que cerca de 10.000 crianças costuravam bolas de futebol no país.

Em um esforço conjunto com a Unicef e a Organização Internacional do Trabalho, as grandes marcas cancelaram contratos com empresas paquistanesas envolvidas na exploração infantil e as autoridades conseguiram diminuir a incidência da prática. As linhas de produção, agora, passam por inspeção independente e precisam cumprir regras que garantam a segurança dos trabalhadores.

A bola da vez

"A Adidas está sempre em busca de empresas parceiras que sejam líderes em seus ramos e que compartilhem nossos valores", disse um porta-voz da multinacional alemã. "A bola da vez da nossa produção agora é o Paquistão."

Além do menor custo de produção por conta dos salários baixos, a Adidas lista ações de combate à pirataria como outro fator para a escolha do país em detrimento da China, que, apesar disso, continua responsável por produzir uma percentagem das Brazucas postas no mercado.

Com quedas na receita, a multinacional aposta no faturamento do futebol em ano de Copa para balancear suas finanças, conforme um relatório e uma carta a acionistas divulgados no início do mês.

Apesar de ter o esporte como base econômica da cidade, os habitantes de Siakolt e os próprios envolvidos na produção das bolas não vão se importar muito com o que estará acontecendo no Brasil a partir do dia 12 de junho.

"Nós construímos um campo de futebol para os funcionários perto do galpão", disse Khwaja Masood Akhtar, o chefe da Forward Sports ao site Global Post. "Eles só jogam críquete lá."