Mato Grosso do Sul
Lama Asfáltica: esquema usado no Detran-MS seria exportado para o Paraguai
Correio do Estado
26 de Novembro de 2020 - 09:46
O documento que narra a investigação do desvio de dinheiro que se dava pela empresa terceirizada ICE Cartões, responsável pela confecção de CNHs, vistoria de veículos e fornecimento de equipamentos para o Departamento Estadual de Trânsito de Mato Grosso do Sul (Detran-MS), aponta que João Baird, provável operador do esquema, queria expandir os negócios para o Paraguai.
Denominado de Projeto PY, a peça descreve “um projeto voltado ao contato com autoridades paraguaias para fornecimento do sistema do Detran/MS para gerenciamento de trânsito no Paraguai”.
Segundo a investigação, o documento fora apreendido na casa de Fábio Portela, um dos alvos da sexta fase da Lama Asfáltica. Ele era também o encarregado da empresa Rave S.A, que era supostamente de João Baird e Antônio Celso Cortez.
A Rave existia com o simples propósito de movimentar recursos para o país vizinho em um esquema de evasão de divisas conforme classificado pela decisão judicial da 3ª Vara Federal de Campo Grande.
O projeto teria sido confeccionado por Odair Ribeiro Mendonça Júnior, citado como funcionário da Itel informática, portanto de João Baird também.
Ainda segundo o documento, o relatório é assinado por Marcos Glienke, que descreve a vinculação com o projeto como “colaborador da ITEL Informática, assistente do Odair [funcionário de Itel] organização do projeto e avaliação comparativa dos sistemas de trânsito brasileiro e paraguaio”.
Quando há transição de governo no estado, Glienke viria a assumir cargo comissionado na Secretaria de Fazenda do Estado de Mato Grosso do Sul.
Conforme divulgado na edição de ontem, em 2015, já havia suspeita de os contratos que envolviam o Detran-MS no final do mandato de André Pucinelli serem supervalorizados.
O episódio foi reportado pelo Correio do Estado à época e citado na peça como um indicativo de suspeita de direcionamento.
Motor de Lama
Na manhã desta terça-feira (24), a Polícia Federal desencadeou a sétima fase da operação lama asfáltica, denominada Motor de Lama.
O esquema, que consistia no pagamento de 10% de propina a empresários locais por uma empresa de São Paulo (SP), a ICE Cartões, pode ter persistido até pelo menos 2019, quando foi encerrada a vigência dos contratos entre o Detran-MS e a sociedade em participação formada pela ICE e a PSG Informática – velha conhecida da Polícia Federal por herdar o espólio da Itel Informática, do empresário João Baird.
Nesta fase também investiga a participação de Rodrigo Silva e Souza, filho do atual governador Reinaldo Azambuja (PSDB). Rodrigo é apontado como o mediador para manter o esquema ativo.
Apesar da proximidade, o governador não é investigado.
Ficam a cargo da ICE cartões os serviços de “solução integrada para registro, validação, controle e monitoramento da verificação de conformidade automotiva (“vistoria veicular”), com fornecimento de equipamentos de informática e disponibilização de mão de obra”.
Os mandados da sétima fase, Motor de Lama, foram cumpridos em Campo Grande e Dourados. De acordo com a Polícia Federal, foram encontrados R$ 96.860,00, U$ 49.000,00, € 11.645,00, £ 795,00, valores que, se somados e aplicados o câmbio atual, chegariam próximo à marca do meio milhão de reais.
A Lama Asfáltica foi deflagrada em 2015, mas as investigações começaram em 2013. Só na primeira fase, os agentes públicos descobriram rombo de R$ 11 milhões nos cofres públicos, causados por fraudes em licitações.
Em setembro de 2019, o ex-governador André Puccinelli, o filho dele, André Puccinelli Junior, e os empresários João Alberto Krampe Amorim e João Baird, entre outros, foram denunciados pelo Ministério Público por corrupção e lavagem de dinheiro.