Mato Grosso do Sul
Números de alvarás de táxi na Capital caiu 45% desde chegada da Uber
"Barões e reis" montaram verdadeiro monopólio em Campo Grande, acumulando permissões que eram divididas entre filhos, esposas e cunhados
Correio do Estado
05 de Junho de 2023 - 14:45
Levantamento na base de dados da Agência Municipal de Transporte e Trânsito (Agetran) mostra que, dos quase 500 alvarás ativos em Campo Grande na era "pré-Uber", só 267 mantém a renovação ativa, indicando que a concorrência levou o, outrora, monopólio "ao pó".
Enquanto as alternativas para transporte na Capital eram depender de ônibus, mototáxis e táxis, podendo praticar preços que bem entendiam, em 2015 existia um total 486 alvarás ativos.
Vale lembrar que naquele ano, os aplicativos de transporte (principalmente e Uber) já iniciava suas operações no Brasil, com sua vinda para a Capital cada vez mais iminente.
Os números mostram que esse total foi caindo com o passar do tempo, até que, quatro anos depois, em 2019 - quando a validade dos alvarás passou a ser de três anos -, Campo Grande já acumulava 393 alvarás ativos.
Confira abaixo a oscilação nos registros de renovação (alvarás ativos) - com exceção dos dois principais anos de pandemia (2020 e 2021).
Ano | Alvarás Ativos |
2015 | 486 |
2016 | 488 |
2017 | 443 |
2018 | 359 |
2019 | 393 |
2022 | 267 |
Início da concorrência
Ainda em 2015, diante da iminência de uma concorrência que ofertava preços mais baixos que os praticados até então, houve inclusive medidas e projeto para tentar deter o Uber de atuar em Campo Grande, assim como em diversas localidades brasileiras.
Essa proibição, dos carros particulares em transporte por aplicativo, chegou a ser alvo de audiência pública.
Importante frisar que o PL chegou a passar na Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul, ainda em 02 de dezembro de 2015.
Porém, dois dias antes do Natal daquele ano, o então governador, Reinaldo Azambuja, publicou o veto ao projeto de lei que proibia o transporte remunerado de passageiros em veículos particulares.
"Lavando as mãos", o texto por sua vez apenas apontava que legislar sobre política nacional de transportes caberia à União, enquanto a competência legislativa sobre essa locomoção individual seria de responsabilidade do município.
CPI dos Táxis
Vale lembrar que, em Campo Grande, houve alguns "barões do táxi", que ainda na década de 70 começaram a montar seus impérios, como o caso Moacir Joaquim de Matos, que chegou a acumular mais de 50 alvarás em seu nome.
Isso acontecia porque, até 1993, não havia um limite imposto de quantos alvarás uma única pessoa poderia acumular. Quando essa regra mudou, Moacir começou a "distribuir" essas permissões.
Conforme apurado na época, ele deixou 15 no nome da esposa, Francisca Pereira dos Santos, e do filho, Elton Pereira de Matos, com a mesma quantia, e oito veículos. Importante ressaltar que, apesar desses títulos em seus respectivos nomes, nenhum deles, além de Moacir, atuava diretamente com o empreendimento de táxis.
Até antes da morte de Moacir, em 2013, a família Matos chegou a responder por mais de 10% de toda a frota de táxis em Campo Grande.
Com isso, em 2017 foi instaurada Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), onde os envolvidos em acumular os alvarás foram chamados para depor.
Instaurada em 11 de abril daquele ano, contou com aprovação de 19 vereadores, motivada pelas denúncias recebidas pelo então vereador, Vinicius Siqueira, de que muitos alvarás de táxi estariam concentrados com determinados grupos familiares.
Além da família Matos, a CPI apurou o segundo maior monopólio, pertencente a Orocídio de Araújo, que também colocou sua esposa, Maria Helena Juliace de Araújo, o cunhado Benevides Juliace Ponce e esposa do cunhado, Gleickermen Bogarim Godoy Ponce no esquema, acumulando 39 carros no nome da família.
Até mesmo o presidente do Sindicato dos Taxistas de Campo Grande(Sintaxi), Bernardo Quartim Barrios, e o presidente do Sindicato dos Mototaxistas de Campo Grande (Sindmototaxi), Dorvair Boaventura de Oliveira.
Através desse trabalho, foi constatado que mais de 80% dos alvarás foram transferidos de maneira informal, sendo necessário na época a quebra de sigilo financeiro e fiscal dos envolvidos.
Já na última etapa dos trabalhos, outras 25 pessoas foram convocadas à Câmara Municipal, já que a situação até o momento apontava para 980 alvarás de permissão de exploração do serviço de táxi e mototáxi em Campo Grande.
Conforme o então vereador Odilon de Oliveira Júnior, nenhum alvará de táxi tinha todas as documentações expressas no Decreto Municipal N.º 3631.
"Sendo elas a cópia da CNH [Carteira Nacional de Habilitação], prova que exerce efetivamente a profissão no município, ficha de sanidade atualizada, certidão negativa criminal, atestado passado pela polícia do estado, prova de cumprimento das exigências sindicais e previdência social", declarou.
Apesar disso, punições não foram previstas a nenhum dos envolvidos.