Mato Grosso do Sul
"Sem vias navegáveis seguras e livres, não há como se desenvolver o agronegócio"
Contra-almirante Iunis Távora Said assumiu o cargo.
Correio do Estado
23 de Setembro de 2023 - 10:24
O Comando do 6º Distrito Naval (DN), em Ladário, deu seus primeiros passos para ser formado há mais de 150 anos, em 1861, chegando até a ser transferido para São Paulo, em 1966.
Porém, retornou para o município sul-mato-grossense em 1975 não só com uma função voltada à segurança, mas também econômica para toda a região do Pantanal, incluindo MS e MT.
Esse distrito tem a responsabilidade de fiscalizar 60 mil km em rios. Para comandar a estrutura, assumiu em março o contra-almirante Iunis Távora Said. Antes de desembarcar na Pérola do Pantanal, ele atuou como adido na França e na Bélgica.
Conforme ele mesmo situou, o trabalho que tem pela frente é favorecer a navegação no Rio Paraguai, que forma a Hidrovia Paraguai-Paraná, a fim de contribuir nos negócios e na balança comercial do Brasil e, claro, de Mato Grosso do Sul. Essa via fluvial é um das principais modais para o escoamento da exploração de minério de ferro, atividade que está em alta em Corumbá e que tem a previsão de ter crescimento neste ano.
“A Marinha contribui para a economia da região, permitindo a exportação e a importação de insumos e mercadorias fundamentais para a mineração e o agronegócio. Vale ressaltar que sem vias navegáveis seguras e livres não há como se desenvolver o agronegócio. O mesmo vale para os produtos bolivianos e paraguaios, que são exportados e importados por nosso imenso Rio Paraguai. Esse rio é ‘o mar da Bolívia e do Paraguai’”, pontuou.
O comandante do 6º Distrito Naval indicou nesta entrevista números que a Marinha vem acumulando com atuações nas áreas social, econômica e de segurança. Também, antecipou que, para o próximo ano, haverá uma grande operação com outros países.
Você assumiu seu posto no Comando do 6º Distrito Naval neste ano. Quais foram as orientações que recebeu para serem desenvolvidas na região e no Pantanal?
Posso destacar a orientação para continuar estabelecendo cooperação com entidades que têm, como fim institucional, a melhoria da sociedade e da prestação de serviços públicos. Não importa a região ou o comando, a missão da Marinha do Brasil será, hoje e sempre, defender as riquezas nacionais e proteger sua gente.
Além disso, é importante apontar que a Marinha procura sempre apoiar nossa população, principalmente os ribeirinhos, por serem aqueles que mais dependem de nossos rios e mares como principal fonte de sustento e subsistência.
Qual o legado que pretende deixar para a região?
O comandante de um distrito naval tem de garantir que a missão da Marinha – empregar o poder naval, entre outras atribuições – seja cumprida. Meu legado será de dar continuidade ao trabalho realizado por meus antecessores no aprimoramento da capacidade das forças navais, aeronavais e de fuzileiros navais na área do Comando do 6º Distrito Naval.
Sem esquecer do apoio que a Marinha presta ao nosso povo e à família naval, em um contexto de promover o desenvolvimento dos estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, em geral, e das cidades de Ladário e Corumbá, em especial.
Quais as principais atuações que ressalta no trabalho do 6º Distrito Naval?
O Comando do 6° Distrito Naval realiza importante papel no cumprimento de suas atribuições legais e constitucionais, em especial, no que tange à defesa da pátria, a garantia da lei e da ordem e na promoção da segurança do tráfego aquaviário.
As atividades na jurisdição do 6º DN são exercidas e cumpridas por meio de nove organizações militares diretamente subordinadas, além de quatro agências fluviais, 10 navios, aeronaves e diversas embarcações menores, em MT e MS,
sua área de jurisdição.
Os trabalhos podem ser destacados em várias áreas, como missões operativas, atividades de sinalização náutica, inspeção naval e formação aquaviária, capacitação de pessoal, ações cívico-sociais, apoio à população ribeirinha, emprego de pessoal e meios de apoio aos órgãos de segurança pública e fiscalização e às instituições públicas e privadas, tanto em âmbito regional quanto estadual.
Nesse contexto, nossos navios e aeronaves, além de sua vocação operativa, prestaram neste ano inúmeros apoios à população com atendimentos médicos e resgates de vítimas na área do Pantanal. Até o momento, já realizamos 28 evacuações aeromédicas.
Como o Comando do 6º Distrito Naval tem influenciado o desenvolvimento da região de Corumbá e Ladário?
A Marinha do Brasil atua no desenvolvimento dessa região de diversas formas. Uma delas é a capacitação de militares. Desde 2019, o 6º DN desenvolve o Programa Marinheiro Empreendedor. Em parceria com a Universidade Federal de Mato Grosso do Sul [UFMS], o projeto capacita militares temporários do Serviço Militar Obrigatório [SMO] e do Serviço Militar Voluntário [SMV] da região de Corumbá e Ladário.
Também voltado à capacitação dos jovens militares que ingressam pelo SMO, o 6º DN desenvolve o Projeto Soldado-Cidadão, sob coordenação do Ministério da Defesa. As duas iniciativas somaram 95 cursos oferecidos em 2022, como de informática básica, utilização de drones, técnico em mineração, administração de empresa rural, operador de empilhadeira, entre outros.
Somente no ano passado, foram mais de 1.600 participantes, totalizando cerca de 600 militares capacitados. O objetivo
é preparar os militares temporários e facilitar a entrada deles no mercado de trabalho após servir à Marinha.
A capacitação é realizada, ainda, pelas capitanias e pelas agências, por meio do ensino profissional marítimo,
habilitando civis a conduzirem e tripularem embarcações, também facilitando a inserção no mercado de trabalho, principalmente em localidades turísticas como é o caso de Corumbá e Ladário.
Em breve, Mato Grosso contará com uma agência-escola, com a incorporação da Agência Escola Flutuante Piquiri. A embarcação também terá a missão de levar cursos de formação aos ribeirinhos do estado.
Ressalto também ações que estão sendo realizadas junto ao comércio local. Em junho, o 6º DN promoveu, em conjunto com o Exército Brasileiro e a Associação Comercial de Corumbá, a 1ª Rodada de Negócios de Corumbá.
Como está a atuação da Marinha para a navegação comercial na Hidrovia Paraguai-Paraná?
Em um contexto mais amplo, ao garantir a segurança do tráfego hidroviário e da segurança da navegação, a Marinha contribui para a economia da região, permitindo a exportação e a importação de insumos e mercadorias fundamentais para a mineração e o agronegócio.
Vale ressaltar que sem vias navegáveis seguras e livres não há como se desenvolver o agronegócio, que exporta seus produtos e importa fertilizantes e insumos, essencialmente por via marítima, com todo o mundo. O mesmo vale para os produtos bolivianos e paraguaios, que são exportados e importados por nosso imenso Rio Paraguai. Esse rio é “o mar da Bolívia e do Paraguai”.
A fiscalização de navios de turismo e outras embarcações ainda precisa avançar no Pantanal?
A Marinha do Brasil realiza constantemente a fiscalização do tráfego aquaviário na região, em prol da segurança da navegação, da salvaguarda da vida humana e da prevenção à poluição ambiental.
Além das inspeções navais rotineiras durante a semana e aos fins de semana, são realizadas diversas operações a fim de incrementar a ação de fiscalização e fomentar a mentalidade de segurança nos aquaviários e nos amadores, por exemplo, a Operação Navegue Legal no Pantanal e a campanha Travessia Segura, com o principal objetivo de prevenir acidentes com embarcações.
A atuação do 6º DN ocorre nos mais de 60 mil km de rios existentes em MT e MS, com destaque para o Rio Paraguai, importante via fluvial da Hidrovia Paraguai-Paraná, por onde trafegam consideráveis parcelas de comodities da economia.
Novas demandas estão surgindo em função do crescimento por parte das empresas que trabalham com o turismo, e a Marinha tem procurado sempre se antever a essas necessidades. Por esse motivo, estamos criando uma patromoria avançada em Alta Floresta [MT] e iniciamos o processo de solicitação da elevação da Agência de Porto Murtinho para Delegacia Fluvial.
Poderia destacar alguns números de ações da Marinha que foram realizadas no Pantanal?
Desde o início do ano, já foram realizadas 1.383 inspeções navais, entre as quais 483 foram somente em embarcações que transportam passageiros. Além disso, foram emitidas 87 notificações de infrações cometidas e, até o presente momento, foi instaurado apenas um inquérito de acidentes e fatos da navegação.
Da mesma forma, foram realizadas 28 evacuações aeromédicas, em proveito do Corpo de Bombeiros, com todas as vítimas trazidas com segurança a Ladário para encaminhamento a hospitais.
Atualmente, a Marinha atua em algum tipo de tratativa ou discussão internacional sobre a navegação no Rio Paraguai e formas de melhoria?
O Brasil é signatário do Acordo de Transporte Fluvial pela Hidrovia Paraguai-Paraná. Periodicamente, representantes da Marinha do Brasil participam de reuniões com os demais países-membros que fazem parte do referido acordo, visando à discussão de temas voltados para o tráfego de embarcações na hidrovia.
As tratativas com relação às regras de utilização da Hidrovia Paraguai-Paraná são realizadas entre os países-membros no nível de seus ministérios das Relações Exteriores. Por esse motivo, cabe a Marinha do Brasil cumprir as determinações oriundas das negociações por eles realizadas e pelas decisões tomadas.
Como a Marinha tem atuado para a conservação do Pantanal?
No período de seca, o Pantanal, maior planície alagada do mundo, sofre com o aumento no número de focos de queimadas na região. Diante desse cenário, a Marinha, no âmbito do Comando do 6º Distrito Naval, ampliou o total de militares qualificados a atuarem em apoio aos trabalhos contra os incêndios e, atualmente, caso necessário, conta com 266 militares para pronto emprego.
Desse total, 194 realizaram o curso de combate a incêndios florestais com brigadistas do Centro Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais [Prevfogo], do Ibama [Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis].
Já outros 72 concluíram o estágio básico de prevenção e combate contra incêndio florestal.
As atividades foram realizadas na Área de Adestramento do Rabicho, em Corumbá.
Nos rios, a Base Fluvial de Ladário, as capitanias e as agências fluviais atuam na prevenção da poluição hídrica oriunda de embarcações e na conscientização de nossos ribeirinhos quanto à importância de preservar esse importante ecossistema do nosso país.
Recentemente, houve uma reunião com a Secretária de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp) e com as forças de segurança estaduais. Como a Marinha tem apoiado nas atividades de combate à criminalidade?
A Marinha contribui junto aos demais órgãos de segurança pública em apoio a atividades de combate à criminalidade.
Recentemente, ocorreu um exercício combinado no qual nossas forças foram empregadas de forma conjunta com as dos demais órgãos de segurança pública, no intuito de preparar a cidade de Corumbá para se opor às ações criminosas do que está sendo chamado de “novo cangaço”.
O Comando do 6º Distrito Naval enfrenta algum tipo de obstáculo em termos financeiros para operacionalização?
O 6º DN recebe repasses de recursos suficientes e que permitem a realização das suas inúmeras atribuições. Cabe aqui ressaltar que as bancadas dos estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul também contribuem com recursos, que são empregados pontualmente na melhoria de nossos navios e nossas aeronaves, bem como na preparação de jovens nos programas Soldado-Cidadão e Forças no Esporte [Profesp].
Já existe algo definido no planejamento para o ano que vem?
Para o ano de 2024, teremos não só as comissões operativas, como também a Acrux, com marinhas de outros países. Vamos ainda dar continuidade ao trabalho realizado por nossas capitanias, no intuito de tornar o tráfego aquaviário cada vez mais seguro.
Esperamos que sejam assinados convênios e acordos com universidades e órgãos ligados à Secretaria de Estado de Saúde de Mato Grosso do Sul, a fim de permitir o embarque de pesquisadores que terão
a oportunidade de realizar trabalhos científicos e prestar assistência às populações ribeirinhas.
Perfil
Iunis Távora Said é natural de Fortaleza (CE). Antes de vir para Ladário, foi comandante do Centro de Instrução Almirante Wandenkolk, que fica na Baía de Guanabara, na cidade do Rio de Janeiro, e também do Comando da Força de Superfície. Ele foi declarado guarda-marinha em 21 de dezembro de 1991.
Said integra o quadro seleto entre os oficiais da Marinha no País; acima dele, ainda existem vice-almirante, almirante de esquadra e almirante, este último posto só concedido em tempos de guerra.