Sidrolandia
Hackers ajudaram procurador-geral do DF
De acordo com relatório da Corregedoria-Geral do Ministério Público, início da relação entre Leonardo Bandarra e Durval Barbosa foi uma ação para retirar da internet informações que comprometiam a ele e ao casal Deborah e Jorge Guerner
Redação de noticia
13 de Maio de 2010 - 15:43
Como jornalista, Roberto Kuppê não é um dos nomes mais conhecidos do cenário da mídia em Brasília. Durante anos, ele foi assessor de políticos de Rondônia na capital. Hoje, mantém um blog, o Blog do Kuppê. Mas, na verdade, Roberto Kuppê é mais conhecido por ter ganho quase R$ 19 milhões na Mega-Sena há dois anos. Hoje, ele administra a sua fortuna como empresário e toca seu blog. Kuppê, porém, está no centro das denúncias que agora atingem o procurador-geral da República do Distrito Federal e Territórios, Leonardo Bandarra. Foi por conta de uma nota que o milionário da Mega-Sena publicou que a promotora de Justiça do Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT) Deborah Guerner se aproximou do ex-secretário de Assuntos Institucionais do GDF Durval Barbosa. E levou com ela, conforme Durval acusa, o procurador Bandarra.
A história é contada em detalhes no relatório da Corregedoria-Geral do MPDFT, ao qual o Congresso em Foco teve acesso na íntegra e cujo conteúdo agora publica, em três capítulos. No primeiro capítulo, revelou-se que Bandarra é acusado de ter vazado para Durval a minuta do mandado de busca e apreensão da Operação Megabyte. Com isso, Durval, que era o alvo principal, pôde desaparecer com documentos que o comprometiam e safar-se da operação. O segundo capítulo começa agora.
A nota publicada por Roberto Kuppê era intitulada MP contaminado. Kuppê dizia que Leonardo Bandarra, Deborah Guerner e seu marido, Jorge Guerner, estariam envolvidos com irregularidades em contratos para prestação de serviços de coleta de lixo no Distrito Federal. De acordo com Durval, em depoimento prestado ao Ministério Público do DF no dia 9 de dezembro do ano passado, no final de 2007, ele foi procurado por uma assessora do governador José Roberto Arruda, de nome Cláudia Marques. Ela agiu então como intermediária do casal Deborah e Jorge Guerner. Como Durval tinha, desde a época em que era presidente da Companhia de Desenvolvimento do Planalto (Codeplan) no governo Joaquim Roriz, contatos com pessoas do ramo da informática, o casal queria saber se ele tinha como tirar do ar a nota de Kuppê e todos os seus desdobramentos pela internet. Àquela altura, diziam eles, a nota já seria motivo de comentários de leitores dos blogs dos jornalistas Reinaldo Azevedo e Diogo Mainardi, da revista Veja.
Naquele momento, Bandarra buscava ser reconduzido ao cargo de procurador-geral da República do DF e Territórios. Segundo o depoimento de Durval, a nota podia prejudicar os planos de Bandarra. Segundo lhe diziam Cláudia Marques e Deborah Guerner, o então procurador-geral da República, Antônio Fernando de Souza, teria orientado Bandarra a retirar das páginas de vários sites aquela notícia negativa. Do contrário, ele não poderia reconduzi-lo ao cargo principal do MPDFT. Se Durval conseguisse fazer o que o casal Guerner lhe pedia, seria recompensado posteriormente com os favores do Ministério Público, recebendo ajuda nos processos.
O que se deu em seguida parece ter sido uma eficiente ação de hackers contra as páginas nas quais a tal nota estava incluída. Durval alegou não ter conhecimentos técnicos para tal tarefa. Procurou um amigo, de nome Renato Martins Júnior, que entrou em contato com outro amigo, da área de segurança da informação (de nome Rodrigo Carpes), e, ao cabo de 20 dias, eles deram sumiço à nota de Kuppê.
Nenhuma dúvida existe de que Durval Barbosa providenciou a retirada de sites da internet da matéria MP contaminado, veiculada no blog de Roberto Kuppê, conclui o relatório da Corregedoria-Geral do MPDFT, assinado pela corregedora-geral, Lenir de Azevedo. A nota, diz a corregedora, de fato desapareceu, e Leonardo Bandarra foi reconduzido ao cargo de procurador-geral do MPDFT no dia 3 de julho de 2008. De acordo com o que é narrado no texto da corregedoria, os hackers conseguiram encontrar menções à nota no blog de Reinaldo Azevedo. Não foi encontrado nada no de Diogo Mainardi.
A primeira providência foi retirar, então, da seção de comentários e do blog do Kuppê as referências à nota. Alguns dias depois, porém, Durval entrou em contato com Rodrigo Carpes: O procurador está puto, porque nós dissemos que o trabalho estava pronto e não estava. Os dois passaram a digitar, então, Leonardo Bandarra no site de buscas Google. Encontraram ali a tal nota. O técnico explicou que aquilo era a memória do Google, a nota original não existia mais.
O técnico iniciou, então, um segundo trabalho, para retirar do Google a referência ao que chamava de links quebrados. Após um tempo, a pesquisa com o nome Leonardo Bandarra não mais retornava o resultado do link das notícias do blog. De acordo com depoimento de Renato Martins Júnior ao Ministério Público, Durval e Carpes chegaram a fazer um relatório onde explicavam como tinham feito a nota de Kuppê sumir da internet. No relatório, eles mencionaram ter executado esse serviço se valendo de um robô. Na realidade, porém, segundo Cláudio, os dois estavam tentando valorizar seu trabalho: não teriam de fato usado robô algum e teriam falhado em retirar referências à nota da seção de comentários de Diogo Mainardi. Segundo Renato Martins Júnior, o que foi feito foi solicitar ao Google o descadastramento dos links que se referiam à nota original.
Relacionamento promíscuo
A partir desse favor, começou a haver estreito e promíscuo relacionamento pessoal entre a promotora de Justiça Deborah Guerner e o então secretário de Assuntos Institucionais, Durval Barbosa, que já se encontrava respondendo a inúmeros procedimentos criminais e de improbidade administrativa, fato este de pleno conhecimento deste MPDFT, escreve a corregedora Lenir de Azevedo.
Encontros e reuniões aconteciam sempre na igreja, o codinome dado à casa de Deborah no Lago Sul. Foi ali que, com o sucesso da operação, Deborah entregou a Durval a cópia da minuta do mandado de busca e apreensão e recebeu, segundo acusa o ex-secretário, R$ 1,6 milhão, para ela e Bandarra, acondicionados em caixas de papelão embrulhadas com papel de presente.
Outro lado
Procurado pelo Congresso em Foco, o procurador-geral do Distrito Federal e Territórios, Leonardo Bandarra, disse, a partir da sua assessoria, que nada pode comentar sobre o relatório da Corregedoria porque não teve acesso a ele. Bandarra estranhou que a imprensa tenha obtido cópia do relatório, que é sigiloso. Somente quando ele tomar conhecimento do inteiro teor do relatório é que poderá se pronunciar, informou a assessoria.
Sobre as denúncias de Durval, porém, de um modo geral, Bandarra se declara inocente. Ele não sabe por que Durval resolveu falar essas coisas, mas desconfia que seja retaliação pelas várias ações que foram movidas contra ele pelo Ministério Público a partir do seu empenho e esforço pessoal, diz a assessoria.