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Sidrolandia

Nove em cada dez estudantes de pedagogia são mulheres e maioria faz curso a distância

Nove em cada dez estudantes de pedagogia são mulheres e maioria faz curso a distância

G1

15 de Outubro de 2017 - 17:54

O perfil de quem vai dar aulas ou atuar na supervisão, coordenação, direção e gestão das escolas brasileiras é predominantemente feminino e majoritariamente pobre. Segundo um levantamento feito a pedido do G1 pelo IDados, empresa especialista em dados de educação, ao ser comparada com as demais carreiras de graduação, a pedagogia se destaca pela prevalência quase total de estudantes mulheres, pela alta porcentagem de matrículas em cursos de educação a distância (EAD) e pela maior incidência de estudantes que vêm de famílias das classes mais pobres do país.

O levantamento cruzou dados de três fontes: o Censo da Educação Superior e os questionários do Enade e da Prova Brasil, respondidos por quem está na faculdade e por quem já dá aulas, respectivamente.

Em 2015, segundo o Censo da Educação Superior, 8% de todas as matrículas em graduação estavam concentradas na carreira de pedagogia, o que representa 652.537 de 8.027.297 estudantes. As mulheres respondiam por 606.678, ou 93% dessas matrículas. Já considerando todos os demais 7.374.760 estudantes, as mulheres ainda representam a maioria, embora em uma porcentagem bem mais baixa, de 54% do total.

Os dados mostram ainda que, no decorrer dos anos, as instituições privadas, onsiderando as instituições privadas com e sem fins lucrativos, aumentaram em 27% seu número de vagas em pedagogia, e sua concentração do total de vagas na carreira subiu de 74,8% para 80,6% entre 2009 e 2015.

As universidades estaduais tiveram a maior queda de participação, e foram as únicas a fechar vagas. Com 70.285 matrículas em 2009, elas respondiam por 12,7% do total. Mas, em 2015, o número havia caído 11%, para 62.780 vagas, o que representa 9,6% de todas as matrículas em pedagogia. Por outro lado, o número de vagas nas universidades estaduais para as outras carreiras de graduação subiu 12%.

Nas universidades federais, o número total de vagas cresceu 14%, mas a representação das federais no total de matrículas em pedagogia caiu de 8,8% para 8,6%. A expansão maior nessas instituições foi em vagas de outras carreiras: nesse grupo, a participação das universidades federais no total de matrículas foi de 14,8% para 15,7%.

Maioria estuda a distância

O curso de pedagogia, que já tinha a maioria das vagas em educação a distância em 2009, seguiu a mesma tendência em 2015: 52,4% das matrículas eram da modalidade EAD. Essa concentração é 3,6 vezes mais alta do que no resto do ensino superior.

A expansão do ensino a distância na pedagogia

Maristela Brito Silva, que tem 40 anos e mora em Artur Alvim, na Zona Leste de São Paulo, é sucinta ao responder o motivo pelo qual escolheu a modalidade EAD quando se matriculou na graduação em pedagogia, no início do ano. "Tenho dois filhos, meu marido trabalha viajando, e eu tinha medo de assumir o compromisso de fazer presencial e não conseguir comparecer", explicou ela.

Ela chegou a fazer três anos e meio dos quatro anos de magistério, até que precisou largar os estudos para trabalhar. Depois, tentou cursar a faculdade de enfermagem, mas o trabalho a fez desistir. Hoje sem emprego há três anos, ela decidiu voltar a investir no sonho de ser professora. "Quando fazia magistério, eu dei aulas no pré em uma escola, e no primeiro ano em outro colégio. Hoje a gente se assusta com o pessoal fazendo estágio, sobre o tratamento aos professores, então prefiro buscar uma vaga em escola particular. Mas se eu prestar concurso e a prefeitura me chamar, eu vou. Pode ser creche... Onde tiver vaga, eu vou."

Para Frei David Santos, diretor-executivo da Educafro, a carreira de pedagogia tem esse perfil porque é desenhado para atrair a classe social mais vulnerável: mulheres pobres. "Existe um total desinteresse da classe média em ser professor", afirmou ele ao G1.

"O curso a distância tem sido uma opção em vista da adaptação ao horário, a disponibilidade de tempo, para cuidar da criança, cuidar da cozinha", disse Frei Davi, ressaltando que as pessoas que estudam e trabalham são, em geral, de famílias com renda mais baixa, que não podem se dedicar apenas à faculdade.

Além disso, ele ressalta o fato de que as faculdades privadas investem em cursos de pedagogia pelo baixo investimento exigido.

De fato, dados do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade) de 2014 mostram que os formandos de pedagogia que fizeram a prova naquele ano vêm de famílias com renda mais baixa do que os estudantes de outros cursos que participaram do exame.

Estudantes de pedagogia x estudantes das demais carreiras

Pedagogia

Demais carreiras

Renda familiar de até três salários mínimos

64,7%

40%

Estudantes cujas mães não estudaram

13,9%

5,2%

Estudantes cujas mães estudaram até a quarta série

45,1%

24,2%

Estudantes que só estudam e não trabalham

22,5%

31,1%

Fonte: IDados/Enade 2014

Desigualdades raciais

Além da desigualdade de renda, o levantamento do IDados aponta também disparidades entre os professores de diferentes cores e raças. Uma série de cruzamento de dados do questionário preenchido pelos docentes do quinto ano do ensino fundamental, na edição de 2015 da Prova Brasil, comparou as respostas dos professores de cada raça para três critérios: a modalidade em que cursou o ensino superior (presencial, semipresencial ou a distância, por exemplo), o nível de escolaridade e o salário.

Em todos eles, os professores que se autodeclararam brancos demonstram uma ligeira vantagem em relação às demais raças. Veja a comparação entre cinco quesitos:

Comparação racial entre professores do ensino fundamental I

Branca

Parda

Preta

Amarela

Índígena

Fez o ensino superior presencial

74%

68,5%

70,9%

70%

63,2%

Não terminou o ensino superior

5,3%

7,6%

8,1%

5,5%

12,2%

Tem diploma de pedagogia

61%

55,4%

56,7%

58,3%

45,8%

Recebe salário de até R$ 2.373

63,4%

69%

66,1%

71,8%

71,7%

Recebe salário entre R$ 2.374 e R$ 4.746

32,6%

28%

29,6%

25,9%

25%

Fonte: IDados/Prova Brasil 2015 (os dados excluem os professores que não sabiam ou não quiseram declarar uma raça)

Formação de qualidade

Segundo Marcos Neira, presidente da Comissão de Graduação da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (FE-USP), quem conclui a graduação em pedagogia pode dar aulas tanto em escolas como em outros ambientes, como os hospitalares e prisionais, além de exercer funções de supervisão, coordenação e direção de escolas. Entre 2001 e 2015, 861.420 pessoas obtiveram o diploma no curso, entre outros motivos porque, desde 2006, para dar aulas em creches, pré-escolas e nos primeiros anos do ensino fundamental, é obrigatório ter ensino superior. Porém, ainda existem salas de aula comandadas por pessoas sem a formação exigida pela Lei de Diretrizes e Bases (LDB).

"Em tese, uma vez que nós temos já uma oferta muito grande de pessoas com nível superior, isso deveria acabar, mas muitas vezes ainda vemos editais com habilitação em magistério", diz Neira.

Outro motivo da crescente procura é a baixa qualidade de outros cursos de licenciatura, como matemática ou ciências humanas, que leva a professores de outras áreas a buscarem uma segunda licenciatura para "aprenderem a ensinar".

O especialista ressalta, porém, que a rápida proliferação de vagas de pedagogia pelo Brasil pode fazer com que muitos cursos sejam oferecidos sem a qualidade necessária. "É um curso muito exigente, ensina história da educação, filosofia da educação, sociologia da educação, política educacional, metodologia, educação em cultura africana e indígena. Não é só ler muito, mas compreender o que está lendo."

Frei Davi Santos diz, porém, que a graduação a distância nem sempre é ruim, e, às vezes, empregadores preferem alguém formado pela internet a um diplomado no curso presencial por causa do maior domínio em computação.

Maristela, que ainda está no segundo semestre de um curso de EAD em uma faculdade particular, mas planeja concluir os seis semestres para finalmente conseguir o diploma de ensino superior, diz que os centenas de estudantes da graduação já se uniram em grupos no Facebook e no WhatsApp para tentar driblar as diversas deficiências no curso, tanto técnicas quanto acadêmicas. "Você tem suporte, mas você envia a sua dúvida e espera. Eles dão um prazo de dois dias. Mas às vezes não respondem. Uma vez tive que ir no pólo para resolver uma dúvida", contou ela.