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Um jornal a serviço do MS. Desde 2007 | Quinta, 17 de Abril de 2025

Aletânia Ramires Gomes

Eles só querem paz: o sofrimento invisível dos familiares dos usuários de substâncias psicoativas

Em Sidrolândia, como em muitas cidades do Brasil, famílias enfrentam silenciosamente o sofrimento causado pela dependência química de seus entes queridos.

Aletânia Ramires Gomes

13 de Abril de 2025 - 17:46

Eles só querem paz: o sofrimento invisível dos familiares dos usuários de substâncias psicoativas
Psicóloga Aletânia Ramires Gomes. Foto: Divulgação

Em Sidrolândia, como em muitas cidades do Brasil, famílias enfrentam silenciosamente o sofrimento causado pela dependência química de seus entes queridos. Pais e mães que convivem com sentimentos de vergonha, impotência e desesperança, agravados pela ausência de políticas públicas eficazes e pelo estigma social que cerca o tema.

A escassez de recursos destinados ao tratamento da dependência química e o suporte limitado oferecido por serviços como o Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) tornam a jornada dessas famílias ainda mais desafiadora. Muitos se veem obrigados a lidar sozinhos com situações complexas, sem orientação ou apoio adequado.

É necessário e urgente a criação de políticas públicas que não apenas tratem, mas também previnam a dependência química, oferecendo suporte real e efetivo àqueles que, exaustos, ainda buscam por esperança e paz.

A dependência química é um problema de saúde pública que cresce silenciosamente, e seus efeitos não se restringem à pessoa usuária. A família, especialmente os pais, torna-se vítima indireta desse processo. Em muitos casos, são idosos que, após uma vida de trabalho e dedicação, veem-se imersos em uma rotina exaustiva de medo, angústia e constante vigilância, sem qualquer rede de apoio real.

As políticas públicas voltadas para o enfrentamento da dependência química ainda são falhas. Programas de prevenção nas escolas são escassos, comunidades terapêuticas recebem poucos recursos, e os CAPS, que deveriam acolher e acompanhar, estão sobrecarregados e limitados. Enquanto isso, o número de jovens sendo cooptados pelo tráfico e caindo no uso abusivo de substâncias só aumenta.

O impacto emocional sobre os pais é profundo. Muitos relatam sentimentos de culpa, vergonha e até pensamentos de morte como forma de escapar de um sofrimento que parece não ter fim. São famílias em colapso, adoecendo emocionalmente por conta da ausência do Estado e do isolamento social.

Enquanto psicóloga, observo cotidianamente o adoecimento de familiares que vivem essa realidade. E sei que, para além do tratamento do dependente, é urgente que se pense em uma rede de suporte à família — com orientação, acolhimento e acompanhamento psicológico.

É urgente que olhemos para além da figura do dependente químico e passemos a enxergar também as famílias que adoecem junto. A ausência de políticas públicas eficazes, o sucateamento de recursos destinados ao tratamento e à prevenção, e o estigma que cerca o tema contribuem para que pais e mães vivam um luto em vida — o luto da esperança, da paz e, muitas vezes, da própria saúde mental.

Como profissional da psicologia, não posso ignorar os impactos devastadores que esse contexto provoca. O sofrimento não pode mais ser invisibilizado. É preciso que o poder público, as instituições e a sociedade como um todo reconheçam e enfrentem essa realidade com seriedade. Prevenção, tratamento e suporte às famílias precisam caminhar juntos.

Que este texto sirva como um grito, bem como, seja uma voz por todos aqueles pais e mães que em silêncio , estão implorando por ajuda, o sofrimento das famílias não pode mais ser naturalizado. Eles também merecem cuidado, escuta e dignidade.


Psicóloga Aletânia Ramires Gomes – CRP 14/05028-1
Especialista em Terapia Cognitivo Comportamental, em Gestão de Políticas Públicas de Gênero, Raça e Etnia, especializada em Neurociências e Comportamento