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Mato Grosso do Sul

Com um aparelho, laudo de perícia em celular leva 1 ano

A situação de penúria do setor de perícia encontra retrato em processo de feminicídio.

Campo Grande News

20 de Janeiro de 2021 - 13:03

Com um aparelho, laudo de perícia em celular leva 1 ano
Localizado em Campo Grande, Instituto de Criminalística Hercílio Macellaro tem o único aparelho para extrair dados de celulares em todo MS. (Foto: Kísie Ainoã)

Com apenas um aparelho para atender todas as perícias de celulares em Mato Grosso do Sul, o Instituto de Criminalística Hercílio Macellaro, localizado em Campo Grande, demora quase um ano para fornecer os laudos solicitados por delegados e promotores.

A situação de penúria do setor de perícia encontra retrato em processo de feminicídio que tramita na 2ª Vara do Tribunal do Júri de Campo Grande. No caso, a ação em que Suetônio Pereira Ferreira é réu pela morte da florista Regiane Fernandes de Farias, 39 anos.

Conforme a movimentação processual, a delegada Bárbara Camargo Alves, da Deam (Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher), informou à Justiça que encaminhou celular para perícia logo que autorizado, mas o instituto requereu, em agosto do ano passado, prazo de 321 dias para conclusão do laudo.

A delegada respondeu ao Instituto de Criminalística que o exame era urgente, com réu preso e tinha preferência legal sobre os demais. O laudo veio em 9 de setembro, com o resultado que não houve sucesso na extração de dados do dispositivo.

Na sequência, o prazo de quase um ano foi comunicado pelo juiz Aluízio Pereira dos Santos ao Gacep (Grupo de Atuação Especial de Controle Externo da Atividade Policial), braço do MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul). Mas o problema não era novidade.

“É de conhecimento deste Grupo que o Instituto de Criminalística Hercílio Macellaro possui apenas 01 (um) aparelho para realização de exames periciais de extração de dados de aparelhos de telefone celular em âmbito estadual, o que gera demanda reprimida e, consequentemente, atraso na elaboração dos laudos”, informou a promotora Luciana Moreira Schenk, em resposta datada de 3 de novembro de 2020.

A promotora informa que a situação já levou a instauração de procedimento e providências junto ao secretário estadual de Justiça e Segurança Pública, mas sem êxito. No caso específico comunicado pelo juiz, o procedimento foi arquivado.

Com um aparelho, laudo de perícia em celular leva 1 ano
Celular de preso por feminicídio teve prioridade, mas instituto chegou a pedir prazo de 321 dias. (Foto: Reprodução)

Impraticável - Diretor do Instituto de Criminalística, Emerson Lopes dos Reis confirmou hoje (dia 20) que há apenas um equipamento para a extração de dados de celular no Estado, mas não divulgou o tamanho da fila de espera. “Prefiro não divulgar, é um dado interno”, diz.

A média para o laudo é de quase um ano, com média de 11 meses. Porém, segundo o diretor, alguns passam na frente dos outros conforme a necessidade. O instituto tinha dois aparelhos, mas a licença de um deles não foi renovada e o equipamento não pode ser usado.

Sobre a possibilidade de fazer a perícia nos aparelhos sem o equipamento, de forma manual, Emerson afirma que é impraticável. “Tem aparelhos com 128 gigas de capacidade”, diz.   O diretor afirma que aguarda a renovação da licença e a chegada de novos equipamentos.

Lamentável – Presidente do Sinpof/MS (Sindicato dos Peritos Oficiais Forenses), Renato Oliveira afirma que o fato de ter apenas um equipamento leva os profissionais a atrasarem os laudos, apesar do trabalho em três turnos. “Lamentavelmente, atrasa os laudos dos celulares. O equipamento não é barato, mas, em termos de Estado, não é impagável”, diz.

Conforme Renato, o extrator de celular novo foi destinado ao setor de inteligência da Polícia Civil.

“Não digo que não é importante. Mas antes de chegar para eles, tinha que ter chegado para a perícia oficial. Porque é nós que vamos produzir a prova. Não adianta bisbilhotar a vida de alguém, através da extração de dados de celular. Mas essa 'bisbilhotagem', mesmo que autorizada por escrito, não serve como prova porque não foi produzida por um perito”.

Ele explica que um único caso, como flagrante de tráfico de drogas, pode levar dezenas de celulares para o Instituto de Criminalística. “O equipamento extrai com maior velocidade as informações que estão nesses celulares, que são verdadeiros computadores”. A solução “caseira” seria abrir aplicativo por aplicativo, mas que consome grande tempo e resultaria numa análise de “olhômetro”.

De acordo com o presidente do sindicato, a situação não se resolve somente com a chegada de novos aparelhos, mas é preciso repor o quadro de peritos. “Faltam mais de 200 peritos. O ideal seria 330, mas atualmente temos 111”, afirma.

De acordo com Renato, o governo autorizou concurso para a categoria em 2018, mas ate hoje não saiu do papel.

A reportagem solicitou informações à Sejusp (Secretaria Estadual de Justiça e Segurança Pública) sobre os equipamentos e concurso, mas não obteve retorno até a publicação da matéria.