Mato Grosso do Sul
"Vamos cobrar dos municípios índices melhores e boas práticas de gestão"
O secretário Pedro Caravina fala do novo programa do governo.
Correio do Estado
01 de Julho de 2023 - 10:30
O deputado estadual licenciado e titular da Secretaria de Governo e Gestão Estratégica (Segov), Pedro Caravina, ocupa uma função das mais difíceis na administração de Eduardo Riedel (PSDB). O motivo é simples: é a cadeira que Riedel ocupou por mais tempo na gestão de Reinaldo Azambuja (PSDB) e que o credenciou para disputar as eleições e tomar posse como governador de Mato Grosso do Sul.
Em entrevista ao Correio do Estado, Caravina mostra que está muito atento às suas responsabilidades e comenta que, para seguir o plano de governo, nem sempre consegue agradar politicamente alguns que têm pedidos que destoam do programa. “O que eu prefiro é [dar] um não objetivo do que um sim que nunca vai acontecer”, afirma.
Ele também revela novidades importantes, como a implantação de um sistema que centraliza as compras de todas as secretarias e impede que processos de licitações que a Governadoria entende como desnecessários sejam abertos por secretarias e autarquias. Para outubro, um novo programa, o Municipalismo 2.0 também promete fazer a diferença: vai cobrar melhoria de índices de Saúde e Educação e adesão a programas de compliance em troca de apoios para obras e programas.
Secretário, o senhor e outros integrantes do primeiro escalão têm levado adiante o Plano Plurianual (PPA) Participativo. Como tem sido a recepção nos municípios?
O governo já esteve em Dourados e Três Lagoas. Em Dourados esteve o Barbosinha, e em Três Lagoas o Eduardo Rocha que conduziu. Agora temos Bonito e outras cidades que são polos regionais para levar o PPA Participativo.
Bom, como ele funciona? Todos sabem que o Plano Plurianual é uma obrigação do gestor público, e a ideia de ele ser participativo é a de poder ouvir todos os segmentos da sociedade. Já abrimos aqui no governo para reuniões setoriais, com o público LGBTQIA+, com o Conselho do Idoso e com outros conselhos, e agora estamos indos às regiões, e cada uma delas têm sua peculiaridade. Por exemplo: em Bonito, vão os municípios do entorno de Bonito. O Estado foi dividido em sete regiões. A ideia basicamente é a de convidar representantes da classe política, vereadores, comerciantes, agricultores, ou seja, toda a sociedade.
Este Plano Plurianual Participativo já é uma maneira de antecipar o programa que vem aí, que vai se chamar Municipalismo 2.0?
Sim. Isso nos ajudará no momento de implantar esse novo programa, esse novo tipo de novo municipalismo. É importante lembrar que o municipalismo foi um viés muito importante do governo de Reinaldo Azambuja.
Digo isso como ex-prefeito de Bataguassu e como ex-presidente da Assomasul [Associação dos Municípios de Mato Grosso do Sul], porque nós tínhamos esse discurso de municipalismo, que sempre foi muito forte.
Todos sempre falavam que o pacto federativo é cruel porque 70% das receitas arrecadadas ficam com a União e estados e municípios têm de se virar com o restante. Então, é importante a presença do Estado nos municípios, e isso começou a ser implantado no governo do Reinaldo [Azambuja].
Mas qual a diferença do Municipalismo 2.0 em relação ao programa Governo Presente, da época do governo de Azambuja?
Esse programa nós devemos lançar em outubro. O Estado vai continuar presente nos municípios, com investimentos, e vamos pegar parte do que está sendo discutido no Plano Plurianual. Mas a diretriz do governo com este novo municipalismo são três áreas específicas: Educação, melhoria do ambiente escolar e pavimentação urbana.
No caso, nós já trabalhamos com a melhoria do ambiente escolar estadual, com reforma das escolas e instalação de equipamentos. Agora nós vamos nos encaminhar para a melhoria do ambiente escolar municipal, que é a Educação Infantil e o Ensino Fundamental.
A melhoria do ambiente de saúde será focada na atenção básica, porque esta é uma obrigação do município. Quando se tem uma atenção básica melhor, o gasto na atenção especializada cai.
O que leva uma doença a se transformar em uma situação mais grave é, muitas vezes, a falta de acompanhamento na atenção básica. Então, nós vamos trabalhar o ambiente de saúde, o ambiente escolar e a pavimentação das ruas.
Além desses três objetivos, haverá alguma novidade na relação com os municípios?
O grande diferencial é que, além de termos o foco nessas diretrizes, vamos fazer os contratos com os municípios nos moldes do contrato de gestão que o governo do Estado já tem com suas secretarias e autarquias, por exemplo. Lógico que é de forma voluntária, porque o município terá a opção de aderir ou não, porque todos sabemos que, assim como o Estado, os municípios têm sua autonomia administrativa.
Aderindo a esta contratualização com o Estado, o município vai se comprometer a receber o investimento e, aí, o grande mote será o seguinte: nós estamos fazendo um convênio com o Sebrae [Serviço de Apoio à Média e Pequena Empresa] para levantar os indicadores de cada município. Vamos, por exemplo, identificar as dificuldades dos municípios, que podem ser na alfabetização ou na infraestrutura das escolas, entre outras, e vamos cobrar do prefeito no contrato de gestão a melhoria desse indicadores.
Essa é a grande diferença em relação ao programa do governo anterior, em que o investimento ocorria onde o prefeito pedia. Agora nós vamos focar nessas diretrizes, conforme apontarem os indicadores. Na Saúde, por exemplo, pode ser que um município tenha um alto índice de diabetes ou um baixo índice de vacinação. E no caso da Secretaria de Estado de Logística, vamos focar na pavimentação das vias urbanas.
Na campanha eleitoral, chegou a se falar na pavimentação de todas as vias do Estado, pelo menos em médio prazo, seria isso?
A Secretaria de Estado de Governo e Gestão Estratégica fez uma parceria com o Imasul [Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul], a Agraer [Agência de Desenvolvimento Agrário e Extensão Rural] e a Semadesc [Secretaria de Estado de Meio Ambiente, Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação] para fazer um levantamento preciso das vias ainda não pavimentadas em Mato Grosso do Sul. Campo Grande, por exemplo, já tem esse número pronto. E vamos falar com os prefeitos e pedir que eles estabeleçam as prioridades, os bairros que eles querem ter pavimentados primeiramente.
E vocês usarão o Fundersul nesse projeto de pavimentação?
Não necessariamente. A ideia é usarmos recursos próprios. Na gestão passada, pavimentamos nos municípios com quase R$ 500 milhões em recursos próprios, e o Fundersul ficou mais para o uso em rodovias e no apoio de estradas vicinais e escoamento da produção. Mas ainda estamos vendo qual será a demanda e avaliando os projetos, para lançar em outubro.
No Municipalismo 2.0, o governo também pretende estender as boas práticas e o compliance para as prefeituras?
Sim. Inclusive, estamos com uma parceria com o Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso do Sul [TCE-MS]. Essa é uma das condicionantes para o município poder participar dessa nossa proposta voluntária, que ele tenha um acompanhamento de compliance, de práticas que possibilitem impedir qualquer possibilidade de desvio de recursos. Estamos planejando bem um procedimento para melhorar a gestão pública.
Em resumo, neste novo programa, vamos continuar colocando recursos dentro do Orçamento, mas cobrando como contrapartida a melhoria nos índices e a implementação de boas práticas de gestão.
Isso é uma forma de garantir a entrega de resultados no fim da administração do governo?
Quando a gente melhora a gestão, a população sente efetivamente que o governo do Estado está auxiliando ela diretamente, né? Quando você cria indicadores e cobra compromisso, você consegue demonstrar mais claramente o que foi feito com o recurso e qual o resultado aplicado pelo governo no município.
A gente quer direcionar recurso do Estado mais diretamente para políticas públicas que vão dar resultado, que vão seguir a diretriz, o plano de governo do governador Eduardo Riedel. Quando os municípios estão bem, o Estado consequentemente está bem também.
Sobre o Programa de Integridade, como está sendo levá-lo adiante, já que agora parece que ele entrou em um novo estágio? Como as prefeituras têm recebido o programa?
É que tudo que é novo, ainda mais quando se fala em controle, tem uma metodologia a ser seguida. É a mesma coisa quando o governo federal colocou um modelo de excelência em gestão a ser seguido para que os municípios pudessem ter acesso aos recursos federais.
É toda uma organização, planejamento de como agir. Quando se implanta uma situação dessas, tudo é muito novo. É um trabalho que tem de ser feito com a Assomasul, mostrando que dá para fazer, dá para criar um mecanismo para evitar desvios de conduta que podem gerar desvios de recursos.
Às vezes, empresas se juntam para burlar uma licitação, e esse produto pode não ser entregue, ou não ser de qualidade, ou ser de um valor maior. Então, essa metodologia inibe esse tipo de situação, e é isso que queremos passar para os prefeitos e, com calma, vamos encaminhando, sempre respeitando a autonomia administrativa dos municípios. O recurso bem aproveitado sempre rende mais.
Agora, secretário, entrando na parte política. Como foi a adaptação na função de político depois de ter sido delegado de polícia? No início do mandato, alguns políticos aliados andaram se queixando de ouvir muitos “nãos” em sua secretaria. Como anda o relacionamento com alguns interlocutores?
Eu acho que essa fase do delegado já passou, ficou lá atrás, né? Ainda é um delegado que está aqui, mas mudei muito. Eu fui prefeito por dois mandatos e, no começo, digo a você que era até mais difícil, porque tinha o jeitão de quem trabalhou a vida inteira na segurança pública. E, na verdade, as pessoas criam uma resistência porque é um modelo diferente.
Aqui é um modelo diferente, em que estamos muito focados na questão da integridade, da gestão séria e comprometida, e meu estilo é um pouco assim, eu não enrolo muito. Eu botei na minha cabeça esse estilo como prefeito e toquei oito anos assim, fui eleito e reeleito.
O que eu prefiro é [dar] um não objetivo do que um sim que nunca vai acontecer. A questão é que o não objetivo cria trauma no início. O cara sai bravo, pensando: “Puxa, esse cara disse não para mim”. E ele fica assim porque se acostumou a ouvir um “fica tranquilo que eu vou ver isso para você”, mas na verdade aquilo nunca vai acontecer. Eu não, eu já digo: “Olha, isso não dá, já isso eu vou tentar fazer”. Então, desse jeito vão se acostumando. Eu acredito que isso tudo já está se acomodando, né? Nós criamos aqui um novo modelo, e isso também é algo diferente.
O que é esse novo modelo?
O que é importante que vocês saibam? Nós temos aqui, em todo o Tesouro, uma conta única que é administrada na Secretaria de Estado de Fazenda [Sefaz], mas as unidades gestoras, como as secretarias e as fundações, têm autonomia administrativa e financeira. Isso não quer dizer que elas podem fazer tudo do jeito que querem, porque existe um plano de governo e uma diretriz.
O que nós fizemos agora, e o governador entendeu que era melhor fazer isso, foi implantar o sistema gestor de compras que antes só existia na SAD [Secretaria de Estado de Administração], que é o sistema que faz todas as licitações e mexe com todas as compras e serviços. A parte de obras, que era feita na Agesul, as licitações da Educação e do Detran e as obras do próprio Detran, nós trouxemos para a Segov. Isso significa que temos o controle de toda compra e de toda obra que vai acontecer.
Claro que a unidade continua tendo autonomia, ela sabe que tem e o quanto pode gastar. Só que nós tínhamos situações no passado que, muitas vezes, não eram prioridades de governo e o processo era iniciado: faziam um termo de referência, que é um processo complexo, um estudo técnico preliminar [ETP], gastava-se uma energia da equipe e, quando chegava para a Fazenda, ela dizia: “Olha, isso não está na programação, não tem recurso para isso e isso não é prioridade do governo”. Assim, perdia-se todo o serviço.
O que acontece agora? O início do processo passa pela Segov, que automaticamente passa pela Governadoria. Vou dar um exemplo: o secretário quer comprar uma nave espacial e ele acha que é importante. Daí nós analisamos se há outras prioridades e perguntamos ao governador se a compra de uma nave está no escopo do programa de governo. “Não, não está”, diz ele. Então dizemos: “Olha, não gaste energia com isso, pois não vai acontecer”. Isso diminui o resserviço.
Mas um controle centralizado como esse pode incomodar também no começo, não?
Vou dizer o seguinte: é uma forma de controle do governador e é gestão. Ele é governador e quer saber o que está acontecendo no governo dele. Ele tem condições de saber, pois é um técnico que conhece isso aqui [esse sistema]. Ele já esteve aqui e fazia todo esse controle no passado, de uma forma manual. Hoje, não. Hoje, nós estamos jogando via sistema. Até mesmo os convênios feitos com outros órgãos e entidades passam por aqui.