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Kamala Harris evita detalhes em propostas e frustra eleitores indecisos

Candidata democrata enfrenta críticas por falta de detalhes, deixando eleitores indecisos enquanto tenta projetar liderança com base em valores e otimismo.

CNN Brasil

18 de Setembro de 2024 - 08:12

Kamala Harris evita detalhes em propostas e frustra eleitores indecisos
Vice-presidente dos EUA e candidata presidencial democrata, Kamala Harris. Foto: Elizabeth Frantz

Eleitores querem mais de Kamala Harris. Mas, enquanto a candidata democrata deixou claro o que ela não é – Donald Trump – ela parece estar relutante ou incapaz de expor um plano abrangente sobre o que exatamente faria como a 47ª presidente.

Em uma entrevista na terça-feira (17), a vice-presidente se manteve em temas amplos e manchetes sobre seu plano econômico, amplamente familiares de um discurso anterior de política de grande escala e de seu discurso na convenção.

Mas uma candidata que tem sido criticada por opositores por viver de “vibes” e surfar em uma onda de alegria, se recusou a dar detalhes e especificidades, citando seus valores e sua experiência para atestar sua sinceridade.

Por exemplo, quando perguntada no evento da Associação Nacional de Jornalistas Negros, na terça-feira (17), sobre como ela aliviaria a “pressão” que muitos americanos sentem em relação aos cuidados com crianças e idosos, ela disse que seu plano era para que nenhuma família gastasse mais de 7% de sua renda com esses custos.

No entanto, ela não ofereceu um roteiro de como impulsionaria uma grande reforma política social em um Congresso que provavelmente será polarizado no próximo ano e não mencionou como pagaria por isso.

Em outra questão difícil, a guerra Israel-Hamas, Kamala Harris foi forte em aspirações, vaga nos detalhes e pareceu pender para os dois lados da questão. “Eu acredito absolutamente que essa guerra precisa acabar. E ela precisa acabar o mais rápido possível”, disse.

“E a forma de alcançar isso é com um acordo de reféns e um cessar-fogo. Estamos trabalhando 24 horas por dia para conseguir isso”. Ela acrescentou: “Muitos palestinos inocentes já morreram”. Poucos discordariam de seu diagnóstico da situação, mas os EUA vêm buscando há meses o que parece uma miragem ao invés de um acordo concreto.

Não há sinais de que Israel e o Hamas queiram um acordo. E, após meses de diplomacia fracassada, a Casa Branca parece estar fazendo uma pausa. Pode ser irrealista esperar que Harris, integrante de uma administração em exercício, rompa com Biden sobre a guerra.

E ela não tem poder para detê-la sozinha. Mas sua indecisão e declarações repetitivas nas últimas semanas mostram poucas evidências de novas ideias. Embora seu desempenho no debate da semana passada tenha projetado força, Harris normalmente não é uma atleta política talentosa em entrevistas espontâneas de alta pressão na mídia, como o ex-presidente Bill Clinton, por exemplo.

E não é natural para ela aprofundar-se nas questões políticas como a senadora Elizabeth Warren, de Massachusetts.

Isso a torna vulnerável a ataques da campanha de Trump e da mídia conservadora de que suas “saladas de palavras” significam que ela não está à altura de ser presidente – mesmo que Trump muitas vezes se comunique em um fluxo de consciência desordenado e espalhe falsidades perigosas.

A pergunta que pode definir a eleição

Isso tudo levanta duas questões-chave. Importa que Harris não seja exatamente uma especialista em políticas? E é realmente provável que essa eleição tão incomum se decida por algo tão convencional quanto uma plataforma política?

Afinal, Harris está se oferecendo como uma chance para os americanos escaparem da amargura e da divisão dos anos Trump.

Seu sucesso em provocar o ex-presidente no debate foi em serviço de seu objetivo principal – expor seu comportamento descontrolado e mostrar que ele não é apto para a Casa Branca.

Os dias em que eleições presidenciais eram decididas por discursos robustos de políticas – se é que eles existiram – foram varridos pela era das redes sociais e pelo som e fúria que o candidato republicano exemplifica.

E, como Harris é uma substituta de última hora para o presidente Joe Biden, não é surpreendente que ela careça de um longo histórico de políticas estabelecidas e programas detalhados.

Questões importam, mas as eleições também envolvem escolhas menos definidas e mais emotivas. Enquanto os eleitores de Trump podem acreditar em sua retórica linha-dura sobre imigração, o vínculo deles com o candidato muitas vezes é ancorado em um senso instintivo de que ele os entende e os protegerá.

O sucesso da vice-presidente pode não estar confinado a suas posições políticas em questões como o aborto – embora essas sejam críticas -, mas sim à sensação de que um futuro diferente e mais otimista está ao alcance com ela no topo da chapa democrata.

E a presidência, mais do que qualquer outro cargo importante, testa o temperamento tanto quanto o peso das políticas.

Mesmo assim, os eleitores que procuram uma abordagem mais detalhada podem ficar desapontados com a candidata democrata. A lista de políticas recentemente adicionada ao site da campanha de Kamala Harris é rudimentar.

E boa sorte em descobrir se ela romperia com Biden na gestão das crises mais prementes do mundo – da guerra na Ucrânia ao desafio da superpotência da China e ao programa nuclear do Irã.

A vice-presidente ainda não fez um grande discurso de política externa desde que se tornou candidata democrata – uma preocupação para os eleitores que se perguntam como ela lideraria o mundo livre.

A relutância de Harris em se submeter a uma rodada de grandes entrevistas na mídia ou eventos com público locais – e sua preferência por influenciadores amigáveis nas redes sociais e pela mídia local – só aumenta a opacidade sobre suas opiniões.

Mas ela não está concorrendo no vácuo – seu oponente indisciplinado está longe de ser um especialista em políticas. Trump costumava mudar as prioridades de sua administração em cima da hora e muitas vezes parece se preocupar mais consigo mesmo do que com a ideologia.

E Harris pode ser inteligente ao evitar assumir posições que possam assustar republicanos desiludidos e eleitores suburbanos moderados que ela está tentando conquistar.

Já, conservadores como o ex-vice-presidente Dick Cheney e a ex-deputada Liz Cheney, que veem Trump como uma ameaça existencial à república, encontraram uma maneira de apoiar a candidata democrata.

Eleitores querem saber mais sobre Kamala Harris

Ainda assim, pesquisas recentes mostram que a vice-presidente tem uma janela de oportunidade para atrair eleitores que querem saber mais sobre ela. E muitos querem detalhes sobre como ela aliviaria suas preocupações econômicas, incluindo os altos preços.

Uma pesquisa do New York Times/Siena College antes do debate presidencial da semana passada mostrou que 28% dos prováveis eleitores queriam saber mais sobre Harris e apenas 9% disseram o mesmo sobre o ex-presidente Trump.

E eleitores nos poucos estados decisivos que vão definir a eleição também estão dizendo à CNN que, embora tenham ficado impressionados com o desempenho dela no debate, ainda precisam de mais detalhes.

“Kamala Harris diz que quer levantar a classe média, mas como?”, Linda Rooney, que votou na ex-governadora da Carolina do Sul, Nikki Haley, nas primárias republicanas, disse à CNN na semana passada. Rooney, dos subúrbios da Filadélfia, não quer votar em Trump, mas expressou preocupação com as posições da candidata democrata sobre fracking e outras questões.

Antonio Munoz, veterano e policial aposentado que possui um bar de tacos em Nevada, está inclinado a votar em Harris, mas está frustrado por ela não ter feito mais para detalhar suas promessas de ajudar pequenas empresas.

“Tenho checado o site dela e você lê, mas não é específico”, disse Munoz. “Precisamos de um plano diferente para superar essa inflação que causou danos severos a muitos negócios. Ela precisa ser mais direta”.

A falta de especificidades pode dar a Trump menos munição para atacar. Mas o risco é que isso deixe Harris sem uma defesa forte. Ela está sendo criticada todos os dias por anúncios negativos nos estados decisivos que zombam dela como arquiteta da impopular “Bidenomics” (união do nome Biden com economia em inglês).

Ela pode estar prometendo reprimir a suposta prática de preços abusivos dos supermercados, mas deixou de lado a questão que preocupa milhões de americanos em sua entrevista de terça-feira na Filadélfia e desviou para outra mensagem.

“O preço das compras ainda está muito alto? Sim. Ainda temos muito trabalho a fazer? Sim. E eu lhes digo que, sim, acredito que ofereço uma nova geração de liderança para nosso país que é sobre, em particular, virar a página de uma era que, infelizmente, nos mostrou tentativas de alguns de incitar o medo, de criar divisão em nosso país”, disse Harris.

A vice-presidente destacou seu plano de oferecer uma dedução fiscal de US$ 50 mil para incentivar pequenas empresas startups, sua proposta de aumentar o crédito tributário infantil para US$ 6 mil e seu impulso para aumentar o número de moradias e fornecer assistência a primeiros compradores. No entanto, como faz com frequência, ela falou em generalidades, em vez de oferecer planos detalhados passo a passo.

E é exatamente assim que deveria ser, de acordo com a única outra mulher indicada à presidência por um grande partido. A ex-secretária de Estado, Hillary Clinton, ridicularizou as exigências por planos de políticas detalhados de Harris.

“Ela não precisa fazer isso. Vou direto ao ponto”, disse Clinton no podcast “On with Kara Swisher”, lançado na segunda-feira (16).

“Detalhes de políticas não vão resolver isso”, disse Clinton. “Eu apresentei mais políticas do que acho que qualquer um jamais apresentou e falei sobre a economia todos os dias, mas literalmente depois da eleição, me disseram que eu nunca falei sobre a economia. Campanha política é realmente sobre mostrar que você pode governar com seus valores de uma maneira que pode melhorar a vida das pessoas”.

Clinton disse que a principal mensagem de Kamala Harris era a correta, ou seja, “Eu vou te ajudar, eu vou te proteger, eu vou tentar te proporcionar oportunidades”.