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Sidrolandia

O Brasil e sua montanha-russo-maranhense

"Nosso alicerce social é um terreno dos mais acidentados, dada a amplitude que se mede entre os estados mais desenvolvidos e os mais atrasados"

Redação de Noticia

29 de Abril de 2010 - 14:40

Sou capaz de apostar - sem nenhum mérito em eventual "acerto", dada a previsibilidade do tal evento - que a desigualdade social será um tema em voga na campanha eleitoral que se aproxima.
 
Não poderia ser diferente. Nosso alicerce social é um terreno dos mais acidentados, dada a amplitude que se mede entre os estados mais desenvolvidos e os mais atrasados.
 
Nesse cenário, um dos ícones do segundo grupo - o dos mais atrasados - é o Maranhão. Tal constatação inclusive motivou recente discurso do presidente da Assembleia Legislativa daquele estado, o deputado estadual Marcelo Tavares (PSB), que se apoiou em dados do IBGE em seu pronunciamento:
 
"O nosso estado (...) tem alguns dos piores indicadores sociais do Brasil. Segundo os dados do IBGE, o Maranhão tem a segunda maior taxa de mortalidade infantil do país e o maior percentual de domicílios urbanos, 43%, com renda per capita de até meio salário mínimo. Os maranhenses apresentam a segunda menor expectativa de vida entre os brasileiros dos 27 estados, 67,6 anos. A esperança de vida média no Brasil é de 72,7 anos. O estado tem também o segundo pior PIB per capita do Brasil (...), atrás até do Piauí. Somos um estado rico com população pobre. E aqui (...) eu tive a oportunidade de verificar os indicadores da geração de empregos formais, no site do Ministério do Trabalho do nosso país. Tive o dissabor de verificar que, nos últimos 12 meses o Maranhão só conseguiu criar ou gerar 2.737 novos postos de trabalho com carteira assinada. O Brasil inteiro gerou um milhão e quinhentos mil novos postos de trabalho. O Maranhão contribuiu, nesta conta, com somente 2.700 empregos formais, menos de 1% do crescimento econômico do Brasil (...)" (discurso proferido em 25/03/2010).
 
Na última terça-feira, o mesmo Marcelo Tavares, que é de oposição à governadora Roseana Sarney (DEM), voltou aos microfones da Casa, deixando os dados sobre a geração de empregos ainda piores. Disse sua excelência que os tais 2.737 postos de trabalho são um dado falso, turbinado por outros programas e pelo concurso de professores. Tavares ainda chamou o governo Roseana de ineficiente: "O Maranhão tem um governo preocupado em mostrar o que não é - com maciço investimento em publicidade - porque a 'eficiência [administrativa] não existe'", disparou.
 
Bem, vamos agora escalar o nosso alicerce social, verificando desta vez um recorte da realidade de indivíduos mais abastados. E veja você que o fenômeno da desigualdade é tão emblemático que faremos essa "luxuosa visita"... sem sair do Maranhão.
 
Sim, seguiremos no estado. Agora, veja você, no prédio da Assembleia Legislativa do Maranhão. Sim, aquela Casa presidida pelo mesmo Marcelo Tavares.
 
E veja só uma das licitações que está tramitando por lá, mais precisamente por meio do pregão presencial nº 23/2010: contratação de serviço de buffet (alimentação, material, pessoal de apoio, decoração especial, locação de espaço físico e mobiliário) para os eventos oficiais da Assembleia maranhense.
 
Até aí, tudo OK. É praxe que tais instituições tenham o seu cerimonial para atuar em eventos de toda ordem os quais lhes caibam, e que contratem tais serviços por meio de licitação, atendendo aos princípios norteadores do Direito Administrativo e da Administração Pública.
 
Mas vejamos alguns detalhes terrivelmente suculentos do edital: em valores máximos, a Casa topa pagar, em seus eventos, até R$ 25 por pessoa em coffe-breaks, de R$ 35 a R$ 45 em lanches e de R$ 58 a R$ 78 em almoços.
 
Ah, mas faltou falar do coquetel, que nunca falta nessas ocasiões: nada menos do que de R$ 85 a até R$ 102 por cabeça. 
 
Todas as cifras acima referem-se "apenas" aos comes e bebes. Serviços e locações de espaços e mobiliários são gastos à parte, devidamente previstos no edital.
 
Devo imaginar que o nobre leitor tenha ficado ligeiramente mareado ou nauseado pela abrupta viagem rumo ao topo da pirâmide social maranhense. E antes que você caia lá de cima, proponho que deixemos o universo paralelo do estado e que, calmamente, retornemos ao Maranhão real, terrivelmente real.
 
A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) do IBGE mostrou que quase 14 milhões de brasileiros sofreram fome por pelo menos um dia em 2004. Desse contingente, mais da metade (52%) estava no Nordeste, sendo o Maranhão o estado com maior percentual de domicílios afetados (18%).
 
Como se vê, para se encarar a nossa montanha-russa (muito mais brasileira do que tudo), é preciso sangue frio e muito, muito estômago!