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Brasil

Queimadas podem elevar preços dos alimentos no Brasil

Somente na última semana os preços no mercado internacional subiram 12%.

Página 1 News

04 de Setembro de 2024 - 14:34

Queimadas podem elevar preços dos alimentos no Brasil
Alguns itens, como açúcar e café, já começam a reagir aos efeitos do clima. Foto: Divulgação

A grave estiagem que afeta várias regiões brasileiras, somada às recentes ondas de calor e às queimadas que atingem lavouras em vários Estados, especialmente em São Paulo, preocupam o consumidor brasileiro, que teme que os efeitos climáticos possam elevar os preços de alguns alimentos.

Segundo especialistas, alguns itens da cesta básica, como açúcar e café, já começam a reagir aos efeitos do clima, com alta de preços. Já outros produtos, como carnes, feijão e laranja, não devem sofrer alterações drásticas tão cedo.

Os canaviais do interior de São Paulo foram fortemente atingidos pela onda de focos de queimadas do final de agosto, com mais de 80 mil hectares de cana destruídos. As perdas causadas nas lavouras deverão impactar nos preços do açúcar, que devem se manter em patamares mais elevados até o primeiro trimestre de 2025.

Além das recentes queimadas, uma longa seca, que atinge o Centro-Sul do País desde abril, deve continuar afetando os canaviais até outubro. “Com isso, a entressafra vai começar mais cedo, porque como a seca danificou os canaviais não haverá muita cana e as usinas terminarão de moer antes este ano”, afirma Maurício Muruci, analista da Safras & Mercado.

Somente na última semana de agosto os preços no mercado internacional subiram 12%, e estão atualmente negociados em torno de 20 centavos de dólar por libra-peso na Bolsa de Nova York. “Nossa expectativa é de que até o final de setembro as cotações alcancem 22 centavos de dólar por libra-peso, podendo chegar a 26 centavos até o final do semestre”, diz.

A alta deve se refletir no mercado interno a partir de outubro. A tendência é de que com o aumento do preço do açúcar VHP (açúcar bruto) – que é o negociado no mercado internacional – as indústrias optem por produzir mais este produto em detrimento do açúcar cristal, que é o vendido para os consumidores. Dessa forma, a cotação do cristal também deve sofrer alta, gerando um efeito em cadeia em diversos alimentos.

“O aumento dos preços do cristal no mercado interno deve impactar toda a indústria de alimentos que utiliza açúcar como ingrediente e também os itens da cesta básica, com reflexos do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) na inflação já visíveis a partir de outubro”, diz o analista.

Também deve ocorrer alta dos combustíveis, o que deve ocorrer a partir do final de setembro, com a valorização tanto do etanol hidratado quanto do anidro, de 10% nos próximos 30 dias.

Já os altos preços do café devem impactar a inflação oficial, medida pelo IPCA, ainda neste mês de setembro. Isso porque entre setembro de 2023 e junho de 2024 embora tenha havido aumento da cotação do produto cru de mais de 100% na variedade conilon, e 87% no arábica, as indústrias vinham segurando o repasse das altas ao consumidor.

No entanto, diante de aumentos tão constantes, as empresas começaram a perder o fôlego e iniciaram os reajustes de preços no varejo. “Até o momento, houve repasse de apenas 18% da alta aos preços para o consumidor, sendo uma boa parte agora em agosto, que deve impactar na inflação de setembro. Outros 18% devem ser repassados até o fim do ano”, explica Celírio Inácio da Silva, diretor-executivo da Associação Brasileira da Industria do Café (Abic).

No caso do café, embora queimadas tenham sido registradas nas regiões produtoras, elas não provocaram prejuízos diretos nos cafezais. “Mas só a notícia de queimada já é um fator para elevar o preço”, diz o diretor da Abic.

As lavouras de café também estão sofrendo com a seca. “Para setembro, que é o mês de florada da safra nova, não há previsão de chuvas, o que deve contribuir para manter os preços em patamares elevados”, avalia Laleska Moda, analista de Café da Hedgepoint Global Markets.

No caso da carne bovina, a crise atual ainda não tem efeitos nos preços nos supermercados, mas pode afetar no futuro. Em Mato Grosso do Sul, o efeito da seca deste ano sobre as pastagens tem reduzido a disponibilidade de animais prontos para abate na região.

De acordo com o analista da Safras & Mercado, Fernando Iglesias, o preço da arroba bovina no Estado tem sido negociada acima dos R$ 240 este mês comparado à média de R$ 220 no início de agosto.

“Há uma dificuldade, sim, das indústrias de conseguir encontrar animais terminados no Estado. Com escalas apertadas, os frigoríficos tem subido os preços mas mesmo assim estão com dificuldade de conseguir bovinos machos”, destaca o analista.

Em São Paulo, o indicador Cepea/Esalq para o Boi Gordo encerrou o agosto com alta de 4,8% em Barretos (SP) e Araçatuba (SP), regiões consideradas referências para o mercado.

Iglesias explica que agosto é um mês caracterizado pela menor oferta de animais terminados a pasto, o que se reflete na alta sazonal de preços, mas que isso tem se agravado pelo tempo seco e pelos incêndios nas áreas produtoras.

Com a escassez de animais, o abate de fêmeas tem ganhado ainda mais força, um fenômeno ancorado na atual fase do ciclo pecuário, mas que também tem refletido a dificuldade de manter matrizes em campo.

“Esse desgaste adicional que as áreas de pastagem estão vivendo em função dos incêndios tende a atrasar a entrada de animais terminados a pasto no mercado não só em Mato Grosso do Sul, mas também em outros Estados”, comenta o analista.

Se isso ocorrer, ele avalia que a oferta só se normalizará a partir de 2025. “Vamos conviver com uma oferta mais tímida nesse período, o que vai gerar efeitos dentro mercado, com alta de preços ao consumidor”, completa Iglesias.

Levantamento feito pelo Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da Esalq/USP indica que os incêndios ocorridos em algumas áreas de citros do interior de São Paulo no final de agosto foram pontuais, não devendo resultar em impactos significativos sobre o volume de frutas disponibilizado no mercado. Ainda de acordo com os relatos de colaboradores do Cepea, as áreas atingidas são pequenas e os proprietários conseguiram controlar o fogo rapidamente.

O mercado de laranja, no entanto, segue pressionado, em função de outras variáveis. “A frente fria que voltou a atingir o Estado de São Paulo no final de agosto, por exemplo, foi um dos fatores que afastou consumidores”, aponta o comunicado do Cepea, complementando que, “além disso, o período de fim de mês também limitou as vendas”.

Por outro lado, a oferta cada vez mais restrita e os altos preços dos contratos industriais seguem dando suporte aos valores médios de negociação da laranja in natura. Em 2024, o aumento do valor ao consumidor chegou a 20%, segundo dados da Fipe.