Brasil
Exército fiscalizou apenas 2,3% de arsenais privados do país em 2020
G1
25 de Outubro de 2021 - 13:28
Em 2020, o Exército fiscalizou apenas 2,3% dos arsenais privados do país — armas que estão nas mãos de caçadores, atiradores e colecionadores, além de lojas e clubes de tiro. A conclusão é do Instituto Igarapé, que lançou um relatório nesta segunda-feira (25).
A partir de dados obtidos via Lei de Acesso à Informação (LAI), o instituto produziu o 2º Boletim Descontrole no Alvo, em que afirma: “O governo federal está favorecendo o armamento de grupos específicos em detrimento da segurança da população em geral”.
Diferentes decretos presidenciais atribuíram à Força o dever de monitorar o armamento registrado por pessoas ou estabelecimentos. O Exército deveria ter inspecionado 311.908 endereços em todo o Brasil em 2020, mas foi somente a 7.234 desses locais.
Até dezembro de 2020, o número de caçadores, atiradores e colecionadores, os chamados CACs, eram 308.510. Lojas e entidades chegavam a 3.398.
Um dos decretos sobre a fiscalização é o 9.493, de 5 de setembro de 2018.
Imagem de arquivo de pistola — Foto: Unsplash/Hosein Charbaghi
“O governo federal adotou uma série de medidas que ampliaram o acesso a grandes quantidades de armas e munições para determinados grupos, sem que qualquer ação de fortalecimento das capacidades de fiscalização fosse adotada”, afirma o relatório.
“Essa facilitação é ainda mais grave no contexto em que o armamento da população é incitado pelo governo federal e apontado como um caminho de ação política, além de ser instrumentalizado por grupos pró-armas que adotam posicionamentos antidemocráticos”, emenda o Igarapé. O g1 procurou o Exército na sexta-feira (22), mas, até a última atualização desta reportagem, a Força não tinha se manifestado.
Inspeção por estados
Arte mostra quantos endereços com armas privadas foram visitados pelo Exército — Foto: Infografia: Elcio Horiuchi/g1
No Exército, o Brasil é dividido em 12 Regiões Militares (RMs). Algumas RMs cuidam de um estado apenas. Outras têm sob sua jurisdição até quatro unidades federativas. São das RMs a responsabilidade por inspecionar os arsenais privados.
São Paulo, por exemplo, sob responsabilidade da 2ª Região Militar e onde está o maior arsenal particular do Brasil, foi o que teve a menor fiscalização: 1,1% — abaixo dos 2,3% da média nacional. Rio de Janeiro e Espírito Santo, da 1ª RM, e o Rio Grande do Sul, da 3ª RM, tiveram 2% dos arsenais fiscalizados, cada uma.
“A situação se torna mais grave porque essa baixa fiscalização está envolvida em um ambiente de desvios dessas armas por pessoas envolvidas em atividades criminosas”, explica a pesquisadora Michele dos Ramos, do Igarapé.
Leis aumentam registros de novas armas
Até 2018, atiradores desportivos tinham seus limites de aquisição definidos de acordo com seu grau de competição desportiva e podiam ter, no máximo:
- 16 armas
- 60 mil projéteis
- 12 kg de pólvora por ano
A partir do Decreto 9.846, de 25 de junho de 2019, qualquer atirador, independentemente do nível, poderia adquirir até:
- 60 armas (sendo 30 de uso restrito)
- 80 mil balas
- 20 kg de pólvora por ano
Os caçadores também tinham limites de compra de 12 armas, 6 mil balas e 2 kg de pólvora por ano. Esses limites foram expandidos para 30 armas, 90 mil projéteis e 20 kg de pólvora.
Para os colecionadores, a lei permitiu ampliar ainda mais o arsenal. Antes, cada pessoa podia ter apenas um modelo de cada arma, ainda que sem limite de unidades. Agora, é possível guardar cinco exemplares de cada marca.
Também houve aumento no número de registros.
Comparando com dezembro de 2018, período anterior ao início do governo Jair Bolsonaro (sem partido), o número de registros ativos de atiradores aumentou 161%. De caçadores, o crescimento foi de 219%, e de colecionadores, de 228%.
“Diante disto, o que preocupa é a baixa capacidade de fiscalização. O Estado precisa controlar esse uso de armamento”, avalia Michele dos Ramos.
“O aumento das armas e munições em circulação sem o correspondente aumento das capacidades estatais para controlar esses instrumentos coloca toda a sociedade em risco”, conclui o Igarapé.
“Tanto o Supremo Tribunal Federal como o Congresso Nacional têm o poder de reverter esse quadro”, emenda. “As instituições precisam agir antes que seja tarde demais.”